Sua empresa acaba de receber uma bonificação generosa de um fornecedor ou uma doação inesperada. A primeira reação é de comemoração, mas logo em seguida surge a dúvida crucial para qualquer gestor diligente: “E agora, preciso pagar imposto sobre isso?”. Essa é uma questão comum no dia a dia de pequenas e médias empresas, que muitas vezes não estão familiarizadas com o tratamento fiscal de receitas não operacionais. A falta de clareza pode levar a erros que geram passivos fiscais e dores de cabeça com o Fisco.
Muitos empreendedores desconhecem que, para a Receita Federal, esses valores são vistos como um aumento no patrimônio da empresa e, portanto, devem ser tributados. Ignorar essa obrigação é um risco significativo, pois a correta declaração dessas receitas é fundamental para a conformidade fiscal. A diferença entre uma gestão tributária eficiente e uma que acumula problemas está, muitas vezes, em compreender a diferença entre elisão e evasão fiscal. Essa incerteza pode levar a erros na apuração de impostos, gerando riscos fiscais que podem culminar em multas severas e até mesmo serem enquadrados nos crimes contra a ordem tributária.
Este artigo é o seu guia definitivo sobre a tributação sobre doações e bonificações. Vamos desmistificar o tema, explicando detalhadamente quais impostos federais (IRPJ, CSLL, PIS/COFINS) incidem sobre essas receitas, como o cálculo funciona em cada regime tributário e, crucialmente, como diferenciar essa obrigação do imposto estadual ITCMD. Ao final, você terá a segurança necessária para registrar esses eventos corretamente e manter sua empresa em dia com suas obrigações.
Principais Destaques
- Doações e bonificações são consideradas “outras receitas” e tributadas por IRPJ e CSLL.
- Empresas do Simples Nacional devem somar o valor à receita bruta no PGDAS-D.
- No Lucro Presumido e Real, os valores integram a base de cálculo do lucro.
- O ITCMD é um imposto estadual sobre o ato da doação, separado dos tributos federais.
Doações e Bonificações: Entendendo a Diferença para o Fisco

Embora possam parecer semelhantes, doações e bonificações têm conceitos distintos que influenciam sua contabilização e tratamento fiscal. Compreender essa diferença é o primeiro passo para garantir a conformidade da sua empresa.
Uma doação é definida como um ato de liberalidade, ou seja, a transferência voluntária de bens, direitos ou valores de uma pessoa (física ou jurídica) para outra, sem que haja qualquer tipo de contraprestação ou pagamento em troca. É um gesto espontâneo que resulta em um acréscimo patrimonial para quem recebe. Por exemplo, se uma fundação doa equipamentos de informática para a sua PME, isso é caracterizado como uma doação.
Já a bonificação geralmente possui um caráter comercial. Ela ocorre quando um fornecedor, por exemplo, envia mercadorias extras sem custo adicional como forma de fidelização, queima de estoque ou incentivo de vendas. Embora não haja um pagamento direto por esses itens, a bonificação é vista como uma vantagem econômica vinculada a uma relação comercial.
Para a legislação federal, o ponto crucial é que tanto doações quanto bonificações são classificadas como outras receitas. Isso significa que elas aumentam o patrimônio da empresa e, como regra geral, devem ser somadas à base de cálculo dos impostos sobre o lucro e o faturamento, independentemente de sua origem.
Tributação Federal: IRPJ, CSLL, PIS e COFINS sobre Doações e Bonificações

Quando sua empresa recebe uma doação ou bonificação, o valor correspondente é considerado uma receita que aumenta o patrimônio líquido. Consequentemente, essa receita está sujeita à incidência de tributos federais. A regra é clara: se houve um ganho, o governo federal o tributará.
Os principais impostos que incidem sobre essas receitas são:
- IRPJ e CSLL: O valor recebido deve ser somado à base de cálculo do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), um tributo federal que incide sobre o lucro das empresas. Da mesma forma, a receita impacta o cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), que financia a Seguridade Social. A lógica é que, ao receber um bem ou valor sem custo, o lucro da empresa aumenta, e sobre esse lucro incidem os impostos. Você pode consultar nosso guia completo sobre o IRPJ para mais detalhes.
- PIS e COFINS: Além disso, essas receitas podem estar sujeitas ao Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS), dependendo do regime tributário da empresa. Para empresas no Lucro Real (regime não cumulativo), essas receitas geralmente entram na base de cálculo. Já no Lucro Presumido (regime cumulativo), a incidência sobre “outras receitas” pode variar, exigindo atenção à legislação específica. Para entender melhor, veja o que são PIS e COFINS.
A base legal para essa tributação reside no fato de que a legislação do Imposto de Renda veda a dedução de doações como despesa para o doador (salvo exceções muito específicas). Isso reforça o entendimento de que, para o recebedor (donatário), o valor representa uma receita tributável.
Como a Tributação Funciona em Cada Regime Tributário (Com Exemplos)

A forma como a tributação sobre doações e bonificações é calculada varia significativamente conforme o regime tributário da sua empresa. É fundamental aplicar a regra correta para evitar erros na apuração.
Simples Nacional
Para empresas optantes pelo Simples Nacional, o tratamento é direto. O valor da doação ou bonificação é considerado uma “receita auferida” e deve ser somado à receita bruta mensal no momento de preencher o PGDAS-D (Programa Gerador do Documento de Arrecadação do Simples Nacional). Essa soma total será a base para o cálculo da alíquota única do Simples.
- Exemplo: Se sua empresa faturou R$ 50.000 em vendas e recebeu uma doação de R$ 10.000 em dinheiro, a base de cálculo para o imposto do mês será de R$ 60.000. Entenda melhor como as doações são tratadas no Simples Nacional.
Lucro Presumido
No regime do Lucro Presumido, a lógica é diferente. O valor da doação ou bonificação deve ser adicionado integralmente à base de cálculo do IRPJ e da CSLL, após a aplicação do percentual de presunção sobre a receita bruta.
- Exemplo: Uma empresa de serviços com presunção de lucro de 32% fatura R$ 100.000. Sua base de cálculo presumida é de R$ 32.000. Se ela receber uma bonificação de R$ 20.000, a base de cálculo final para IRPJ e CSLL será de R$ 52.000 (R$ 32.000 + R$ 20.000). Saiba mais sobre como funciona a tributação no Lucro Presumido.
Lucro Real
Para empresas no Lucro Real, o valor da doação ou bonificação entra diretamente na Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) como “outras receitas”. Esse valor irá compor o lucro contábil da empresa, que é a base para o cálculo do IRPJ e da CSLL, antes das adições e exclusões previstas na legislação.
- Exemplo: Se o lucro contábil apurado antes de considerar a doação era de R$ 200.000, e a empresa recebe uma doação de R$ 50.000 em equipamentos, o lucro contábil ajustado passa a ser de R$ 250.000, sobre o qual os impostos serão calculados. Conheça as regras de apuração do Lucro Real.
Atenção: Não Confunda com o ITCMD (Imposto Estadual)

Um dos erros mais comuns ao lidar com a tributação sobre doações é confundir os impostos federais (IRPJ, CSLL) com o imposto estadual. É vital entender que eles são independentes e incidem sobre fatos geradores distintos.
O ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação) é um imposto de competência estadual que incide sobre a transmissão não onerosa de quaisquer bens ou direitos, como heranças ou doações, para pessoas físicas ou jurídicas.
Enquanto os tributos federais incidem sobre o acréscimo patrimonial que a doação gera para a empresa (ou seja, sobre o lucro), o ITCMD incide sobre o ato da doação em si. A responsabilidade pelo recolhimento do ITCMD geralmente é do donatário (quem recebe a doação), mas as regras, alíquotas e isenções variam drasticamente de um estado para outro.
Portanto, ao receber uma doação, sua empresa pode ter uma dupla obrigação:
- Federal: Pagar IRPJ, CSLL e, eventualmente, PIS/COFINS sobre o valor recebido, pois ele é considerado receita.
- Estadual: Pagar o imposto estadual sobre Heranças e Doações (ITCMD), conforme a legislação do seu estado.
É crucial consultar a Secretaria da Fazenda do seu estado para verificar as regras específicas do ITCMD aplicáveis ao seu caso.
Recebimento em Bens vs. Dinheiro: Como Declarar?

A forma como a doação ou bonificação é recebida — seja em dinheiro ou em bens — impacta diretamente a forma de declaração e o valor a ser considerado para a tributação. A documentação correta é a chave para evitar problemas.
Se o recebimento for em dinheiro, o processo é mais simples. O valor a ser adicionado à base de cálculo dos impostos é exatamente o montante que entrou no caixa ou na conta bancária da empresa. É fundamental que haja um registro claro dessa transação, como um comprovante de transferência ou um recibo.
Caso a doação ou bonificação seja em bens (como máquinas, veículos, imóveis ou mercadorias), a regra é utilizar o valor justo de mercado do ativo recebido. Esse valor deve ser apurado de forma criteriosa, preferencialmente com base em laudos de avaliação, notas fiscais de produtos similares ou outras evidências de mercado. O bem deve ser registrado no ativo imobilizado ou no estoque da empresa por esse valor.
Em ambos os casos, a documentação é essencial. Para doações, é altamente recomendável formalizar um contrato de doação. Para bonificações, a nota fiscal (com CFOP específico, como 5910 ou 6910) é o documento hábil que comprova a operação e o valor dos produtos recebidos, servindo de suporte para a correta escrituração contábil e fiscal.
Conclusão
Navegar pela tributação sobre doações e bonificações pode parecer complexo, mas o princípio fundamental é claro: qualquer vantagem econômica que aumente o patrimônio da sua empresa é, em geral, considerada uma receita tributável. Essas receitas devem ser somadas à base de cálculo do IRPJ e da CSLL, e em alguns casos também do PIS e da COFINS, seguindo as regras específicas de cada regime tributário.
O ponto mais importante a ser lembrado é a distinção crucial entre a esfera federal e a estadual. Enquanto os impostos federais incidem sobre o lucro gerado pelo acréscimo patrimonial, o ITCMD é um imposto estadual que tributa o ato da transmissão gratuita do bem ou direito. Estar ciente de ambas as obrigações é vital para a plena conformidade fiscal.
A complexidade das regras e as diferenças entre os regimes tributários tornam o suporte profissional indispensável. Para garantir que sua empresa classifique e declare corretamente essas receitas, evitando multas e problemas com o Fisco, a melhor decisão é sempre consultar seu contador. Um profissional qualificado poderá analisar o caso concreto e assegurar que todas as obrigações sejam cumpridas com segurança e eficiência.
Perguntas Frequentes
Empresa do Simples Nacional paga imposto sobre doação?
Sim. O valor recebido em doação ou bonificação deve ser somado à receita bruta mensal da empresa no PGDAS-D. A alíquota do Simples Nacional incidirá sobre o faturamento total, incluindo o valor da doação, pois é considerado uma receita auferida.
Qual a diferença entre a tributação de doação e bonificação?
Para fins de impostos federais (IRPJ, CSLL, PIS/COFINS), não há diferença prática. Ambas são tratadas como “outras receitas” e aumentam a base de cálculo dos tributos. A distinção é mais conceitual e contábil, mas o impacto fiscal é geralmente o mesmo.
Recebi uma doação em bens, não em dinheiro. Como o imposto é calculado?
O imposto é calculado sobre o valor justo de mercado do bem recebido. É sua responsabilidade determinar esse valor com base em avaliações, notas fiscais de itens similares ou outros critérios razoáveis, registrando o ativo na contabilidade por esse montante.
Quem é responsável por pagar o ITCMD em uma doação para empresa?
Geralmente, a responsabilidade pelo pagamento do ITCMD é do donatário, ou seja, da empresa que recebe a doação. No entanto, as regras específicas, alíquotas e possíveis isenções são definidas pela legislação de cada estado, sendo essencial consultar a Secretaria da Fazenda local.
Sobre o Autor
Júnior Araújo
- Título: Contador e CEO da Junior Contador Digital;
- Registro CRC: SP-345376;
- Formação: Ciências Contábeis – Faculdade de Americana (FAM);
- Expertise Principal: Consultoria contábil e fiscal estratégica, com foco em estratégias de estruturação de holdings patrimoniais, planejamento tributário e otimização fiscal para empresas de diversos portes.
- Conhecimento Adicional: Integração de tecnologia em processos contábeis, Normas IFRS;
- Papel no Blog: Editor-Chefe e autor, compartilhando conhecimento prático para PMEs.
Referências
- Orientação Tributária sobre IRPJ: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/tributos/IRPJ
- Orientação Tributária sobre CSLL: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/tributos/CSLL
- Fundos Governamentais PIS/PASEP: https://www.gov.br/tesouronacional/pt-br/ativos-da-uniao/fundos-governamentais/pis-pasep
- Tabelas de Códigos COFINS: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/declaracoes-e-demonstrativos/dctf/tabelas-de-codigos-extensoes/cofins
- Portal do Simples Nacional: https://www8.receita.fazenda.gov.br/simplesnacional/
- Lucro Real, Presumido e Arbitrado: https://www.gov.br/pgfn/pt-br/cidadania-tributaria/por-assunto/indice-assuntos-portal/irpj-csll/lucro-real-lucro-presumido-e-lucro-arbitrado
- Lei nº 8.137 – Crimes Contra a Ordem Tributária: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8137.htm
- Lei nº 9.249 – Legislação do IRPJ e CSLL: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9249.htm
- Contabilização de Bonificações de Mercadorias: https://apet.org.br/artigos/saiba-como-funciona-a-contabilizacao-das-bonificacoes-de-mercadorias-para-quem-concede-e-para-quem-recebe/
- Informações sobre o ITCMD: https://www.sef.sc.gov.br/saiba-mais/itcmd-imposto-sobre-transmissao-causa-mortis-e-doacao-de-quaisquer-bens-ou-direitos
