Você contratou um designer freelancer para um projeto e agora precisa fazer o pagamento. E agora, basta transferir o valor combinado? A resposta é não. Pagar um profissional autônomo (pessoa física) envolve responsabilidades fiscais cruciais para a sua empresa, e ignorá-las pode resultar em multas pesadas e complicações com a Receita Federal. A obrigação de reter imposto na fonte é um mecanismo que transfere ao contratante o dever de calcular e recolher os tributos devidos pelo prestador.
Muitos empreendedores não sabem, mas a simples transferência bancária não é suficiente e não oferece segurança jurídica. É fundamental entender que impostos como IRRF, INSS e, em alguns casos, o ISS, devem ser descontados diretamente do valor a ser pago. Esse processo, embora pareça burocrático, é a única forma de garantir a conformidade fiscal do seu negócio e evitar problemas futuros.
Este artigo é o seu guia definitivo. Vamos detalhar, passo a passo, como funciona a retenção, quais são os impostos envolvidos, como calculá-los corretamente utilizando o Recibo de Pagamento Autônomo (RPA) e quais as obrigações acessórias que sua empresa precisa cumprir. Para uma visão geral, consulte nosso guia completo sobre retenção de impostos na fonte.
Principais Destaques
- Calcule a retenção de 11% de INSS sobre o valor do serviço, respeitando o teto.
- A base de cálculo do IRRF é o valor bruto menos a contribuição do INSS.
- A empresa também paga 20% de Contribuição Patronal (CPP), exceto algumas do Simples.
- Use o RPA para formalizar o pagamento e os cálculos dos descontos.
PJ x PF: Por que a Retenção de Impostos é Diferente?

A principal dúvida de muitos gestores é entender por que o processo de pagamento para uma pessoa física (PF) é tão diferente do pagamento para uma pessoa jurídica (PJ). A resposta está no conceito de responsabilidade tributária.
Ao contratar uma empresa (PJ), que possui um CNPJ, a responsabilidade pelo recolhimento da maioria dos impostos é dela, formalizada pela emissão de uma Nota Fiscal. Nesse cenário, sua empresa apenas paga o valor combinado pelo serviço. Você pode entender melhor como funciona a retenção de Imposto de Renda para serviços entre empresas (PJ).
Já na contratação de uma pessoa física, a formalização ocorre via Recibo de Pagamento Autônomo (RPA), e a lei inverte a responsabilidade. O Fisco entende que a empresa (fonte pagadora) tem mais estrutura para realizar os cálculos e o recolhimento dos tributos do que o profissional individual. Isso acontece porque a legislação define o Trabalhador Autônomo como um prestador que atua por conta própria, sem vínculo empregatício, o que exige um tratamento fiscal específico.
Quais Impostos Devem ser Retidos no Pagamento a um Autônomo?

Ao pagar um profissional autônomo, sua empresa precisa estar atenta a três impostos principais. A ausência de retenção de qualquer um deles pode gerar passivos fiscais significativos.
INSS (Contribuição Previdenciária)
A contribuição para o INSS garante ao autônomo direitos previdenciários como aposentadoria, auxílio-doença e salário-maternidade. A empresa contratante deve reter 11% sobre o valor do serviço prestado, respeitando o teto do INSS. Além da parte do profissional, a empresa também tem sua própria contribuição, como veremos adiante.
IRRF (Imposto de Renda Retido na Fonte)
O Imposto de Renda Retido na Fonte (IRRF) funciona como uma antecipação do Imposto de Renda que o profissional deveria pagar. A empresa calcula o valor com base em uma tabela progressiva e o recolhe diretamente para a Receita Federal. Este é um dos principais impostos federais que incidem sobre serviços prestados por pessoas físicas.
ISS (Imposto Sobre Serviços)
Este é um imposto municipal, e sua retenção depende da legislação da cidade onde o serviço foi prestado. Em muitos municípios, a responsabilidade de reter o ISS é atribuída à fonte pagadora (a empresa). É crucial consultar a prefeitura local para verificar as regras, alíquotas e se o serviço em questão exige a retenção.
Passo a Passo: Como Reter e Recolher os Impostos Corretamente

Para garantir que sua empresa cumpra todas as exigências legais, siga este processo detalhado. Ele transforma uma tarefa complexa em uma sequência lógica de ações.
Passo 1: O Recibo de Pagamento Autônomo (RPA)
Tudo começa com a emissão do RPA. Este documento não é apenas um recibo; ele é a base legal para todos os cálculos de retenção. O RPA deve conter os dados da sua empresa (fonte pagadora), os dados do profissional autônomo e a descrição detalhada dos serviços prestados, com o valor bruto acordado.
Passo 2: Cálculo da Retenção do INSS
O primeiro cálculo é o do INSS. A empresa deve reter 11% sobre o valor bruto do serviço. No entanto, essa retenção é limitada ao teto da Previdência Social.
Exemplo Prático:
- Valor do serviço: R$ 4.000,00
- Alíquota de INSS: 11%
- Cálculo: R$ 4.000,00 * 11% = R$ 440,00
- Valor de INSS a ser retido: R$ 440,00
Se o valor do serviço fosse R$ 8.000,00, o cálculo de 11% ultrapassaria o teto. Nesse caso, a retenção seria limitada ao valor máximo definido pela tabela do INSS para o ano vigente.
Passo 3: Cálculo da Base de Cálculo do IRRF
Um erro comum é calcular o IRRF sobre o valor bruto do serviço. O correto é primeiro deduzir o valor retido de INSS para encontrar a base de cálculo.
Fórmula: Base de Cálculo do IRRF = Valor Bruto do Serviço - Valor do INSS Retido
Continuando o exemplo:
- Valor Bruto: R$ 4.000,00
- INSS Retido: R$ 440,00
- Cálculo: R$ 4.000,00 – R$ 440,00 = R$ 3.560,00
- Base de Cálculo para o IRRF: R$ 3.560,00
Passo 4: Cálculo do IRRF
Com a base de cálculo em mãos, aplique a alíquota da tabela progressiva do IRPF e deduza a parcela correspondente.
Tabela Progressiva do IRPF (Exemplo – valores hipotéticos):
| Base de Cálculo (R$) | Alíquota (%) | Parcela a Deduzir (R$) |
|---|---|---|
| Até 2.112,00 | Isento | 0 |
| De 2.112,01 a 2.826,65 | 7,5% | 158,40 |
| De 2.826,66 a 3.751,05 | 15% | 370,40 |
| De 3.751,06 a 4.664,68 | 22,5% | 651,73 |
| Acima de 4.664,68 | 27,5% | 884,96 |
Aplicando ao exemplo:
- Base de Cálculo: R$ 3.560,00 (enquadra-se na alíquota de 15%)
- Cálculo Bruto do IRRF: R$ 3.560,00 * 15% = R$ 534,00
- Dedução: R$ 534,00 – R$ 370,40 (parcela a deduzir da faixa)
- Valor do IRRF a ser retido: R$ 163,60
Passo 5: Pagamento dos Impostos
Após os cálculos, a empresa deve pagar os valores retidos ao governo.
- INSS: O valor retido (R$ 440,00) deve ser pago via Guia da Previdência Social (GPS) até o dia 20 do mês seguinte ao do pagamento.
- IRRF: O valor retido (R$ 163,60) deve ser pago via DARF (código 0588) até o dia 20 do mês seguinte ao do fato gerador. Veja aqui como preencher o DARF (Documento de Arrecadação de Receitas Federais).
O valor líquido a ser pago ao profissional será: R$ 4.000,00 – R$ 440,00 (INSS) – R$ 163,60 (IRRF) = R$ 3.396,40.
E a Contribuição Patronal (INSS CPP)? A Empresa Também Paga!

Muitos empresários acreditam que a obrigação com o INSS termina na retenção dos 11% do autônomo. No entanto, há mais um custo: a Contribuição Previdenciária Patronal (CPP).
Além do valor descontado do profissional, a empresa contratante é obrigada a recolher 20% sobre o valor bruto do serviço como sua própria contribuição para a Previdência. No nosso exemplo de R$ 4.000,00, a empresa pagaria mais R$ 800,00 de CPP. Essa contribuição é obrigatória para empresas do regime de Lucro Presumido e Lucro Real, que pagam impostos como o IRPJ com base em suas apurações contábeis.
A boa notícia é para as empresas do Simples Nacional. As que se enquadram nos Anexos I, II, III e V geralmente estão isentas dessa contribuição patronal sobre serviços de autônomos, pois seus impostos já são recolhidos de forma unificada na guia DAS.
Obrigações Acessórias: Não Basta Apenas Pagar

A conformidade fiscal não se resume a calcular e pagar os impostos. É igualmente importante informar ao governo sobre essas operações. As duas principais obrigações acessórias são a DIRF e o eSocial.
Anualmente, sua empresa deve entregar a DIRF, um documento que detalha todos os pagamentos feitos a pessoas físicas e os valores de IRRF retidos ao longo do ano. É com base nessa declaração que a Receita Federal cruza os dados com a declaração de Imposto de Renda do profissional. Para mais detalhes, acesse nosso guia para informar essas retenções na DIRF (Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte).
Mensalmente, os pagamentos a trabalhadores autônomos devem ser informados no eSocial através do evento S-1200 (Remuneração de Trabalhador vinculado ao Regime Geral de Previd. Social). Essa obrigação garante que as informações sobre as contribuições previdenciárias sejam registradas em tempo real, mantendo a empresa em dia com o Fisco.
Conclusão
Contratar um profissional autônomo é uma excelente estratégia para ter acesso a talentos específicos sem aumentar os custos fixos da folha de pagamento. No entanto, essa flexibilidade vem acompanhada de responsabilidades fiscais claras. A obrigação de reter imposto na fonte protege sua empresa de passivos tributários que podem comprometer a saúde financeira do negócio.
O processo pode parecer complexo, mas se resume a quatro ações principais: formalizar o serviço com o RPA, calcular corretamente as retenções de INSS e IRRF, recolher os impostos via GPS e DARF, e declarar as operações no eSocial e na DIRF. Um bom planejamento tributário começa com a execução correta das obrigações básicas, como reter imposto na fonte.
Ao seguir essas diretrizes, você não apenas cumpre a lei, mas também estabelece uma relação transparente e profissional com seus prestadores de serviço, fortalecendo a imagem e a segurança jurídica da sua empresa.
Perguntas Frequentes
Preciso reter imposto de um MEI?
Não. O Microempreendedor Individual (MEI) é considerado uma pessoa jurídica (PJ) e emite Nota Fiscal de Serviço (NFS-e). Nesse caso, não há retenção de INSS ou IRRF pela fonte pagadora, pois o MEI já recolhe seus impostos de forma simplificada na guia DAS-MEI.
E se o valor do serviço for muito baixo?
Existem limites de isenção. Para o IRRF, pagamentos abaixo do valor da primeira faixa da tabela progressiva (atualmente R$ 2.112,00) são isentos de retenção. Para o INSS, a contribuição é obrigatória sobre qualquer valor, mas há um salário mínimo como base de contribuição.
O que acontece se eu não reter os impostos?
A empresa se torna responsável pelo pagamento integral dos impostos não retidos, acrescidos de multa e juros. As multas podem chegar a 75% do valor do tributo devido, além de a empresa poder ser alvo de uma fiscalização mais ampla da Receita Federal.
Posso contratar um autônomo de forma contínua?
Cuidado. A contratação contínua, com características de subordinação, pessoalidade e habitualidade, pode configurar um vínculo empregatício. Essa prática é conhecida como “pejotização” e expõe a empresa a os riscos fiscais e trabalhistas da Pejotização, como ações trabalhistas e multas elevadas.
Sobre o Autor
Júnior Araújo
- Título: Contador e CEO da Junior Contador Digital;
- Registro CRC: SP-345376;
- Formação: Ciências Contábeis – Faculdade de Americana (FAM);
- Expertise Principal: Consultoria contábil e fiscal estratégica, com foco em estratégias de estruturação de holdings patrimoniais, planejamento tributário e otimização fiscal para empresas de diversos portes.
- Conhecimento Adicional: Integração de tecnologia em processos contábeis, Normas IFRS;
- Papel no Blog: Editor-Chefe e autor, compartilhando conhecimento prático para PMEs.
Referências
- Tributo IRPJ: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/tributos/IRPJ
- Declaração do Imposto de Renda Retido na Fonte (DIRF): https://www.gov.br/pt-br/servicos/declarar-imposto-de-renda-retido-na-fonte
- Instituto Nacional do Seguro Social (INSS): https://www.gov.br/inss/pt-br
- Sistema de Escrituração Digital (eSocial): https://www.gov.br/esocial/pt-br
- Evasão e Elisão Fiscal: https://www.contabeis.com.br/noticias/40666/evasao-e-elisao-fiscal
- Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ): https://jucees.es.gov.br/Contents/Item/Display/680
- Tributo IRRF: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/assuntos/orientacao-tributaria/tributos/IRRF
- Guia sobre Recibo de Pagamento Autônomo (RPA): https://exame.com/invest/guia/rpa-o-que-e-red04/
- Lei sobre Trabalhador Autônomo: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5890.htm
