Ao dar o primeiro passo no mundo do empreendedorismo, uma das dúvidas mais comuns é sobre a necessidade de contratar um contador. Muitos veem esse profissional apenas como um custo adicional, especialmente na fase inicial, onde cada centavo conta. Mas a verdade é que, na grande maioria dos casos, o contador não é apenas recomendado, mas uma exigência legal e um pilar para a saúde do negócio.
Vamos desmistificar essa questão, entender a regra geral, a principal exceção e, mais importante, por que o contador deve ser visto como seu primeiro parceiro estratégico.
A Regra Geral: Por Que a Maioria das Empresas Precisa de um Contador?
A resposta curta é: sim, a maioria das empresas precisa de um contador desde o primeiro dia. A legislação brasileira, especificamente o Código Civil em seu Art. 1.179, estabelece que toda sociedade empresária é obrigada a manter uma escrituração contábil regular. E para que essa escrituração tenha validade legal, ela precisa da assinatura de um contador devidamente registrado no Conselho Regional de Contabilidade (CRC).
Na prática, isso se manifesta em diversas situações. Uma empresa que busca um empréstimo bancário, por exemplo, precisa apresentar balanços e demonstrações financeiras. Esses documentos só são aceitos pelas instituições se forem assinados por um contador. O mesmo vale para participar de licitações ou simplesmente para manter a regularidade fiscal perante o governo.
Portanto, a ausência de um contador não é uma escolha, mas uma irregularidade grave. Sem ele, a empresa fica impossibilitada de cumprir suas obrigações fiscais e contábeis, tornando-se vulnerável a multas pesadas e impedida de crescer, obter crédito ou participar de concorrências públicas. O principal desafio para o novo empreendedor é enxergar esse custo inicial não como uma despesa, mas como um investimento essencial para a segurança e o futuro da operação.
A Grande Exceção à Regra: O Microempreendedor Individual (MEI)
Existe uma exceção importante a essa regra: o Microempreendedor Individual (MEI). Este é um regime jurídico simplificado, criado para formalizar pequenos autônomos e profissionais liberais. A legislação que o instituiu, a Lei Complementar nº 123/2006, dispensa o MEI da obrigatoriedade de manter uma escrituração contábil formal.
Por consequência, o MEI não é obrigado a contratar um contador. Um fotógrafo que fatura dentro do teto permitido para a categoria, por exemplo, pode abrir seu CNPJ, emitir notas fiscais e pagar seus impostos em uma guia única mensal (o DAS) por conta própria. Para quem se enquadra nas regras, ser MEI é a forma mais rápida e barata de se formalizar.
Contudo, essa simplicidade vem com limitações, como o teto de faturamento e a permissão para contratar apenas um funcionário. O maior risco é ultrapassar o limite de faturamento sem o devido controle e ser desenquadrado retroativamente, o que pode gerar uma alta carga de impostos a pagar. Além disso, mesmo para o MEI, a ajuda de um contador pode ser vantajosa para comprovar lucros maiores que o limite de presunção, garantindo isenção de Imposto de Renda na declaração de pessoa física.
Além da Obrigação: O Contador como Parceiro Estratégico do Negócio
Reduzir o papel do contador a uma mera obrigação legal é um erro que pode custar caro. Ele deve ser visto como o primeiro e mais importante parceiro estratégico do empreendedor. É este profissional que traduz os números da empresa em informações valiosas para a tomada de decisões inteligentes.
Antes mesmo da abertura do CNPJ, o contador realiza um planejamento tributário para definir o regime mais econômico (Simples Nacional, Lucro Presumido, etc.), ajuda a escolher a natureza jurídica correta (LTDA, SLU) e elabora um Contrato Social sólido que protege os sócios. Uma escolha errada em qualquer uma dessas etapas pode fazer a empresa pagar milhares de reais a mais em impostos todos os anos.
Considerando o alto índice de mortalidade de empresas no Brasil, começar com uma base sólida e profissional não é um luxo, mas um fator crucial de sobrevivência. Para isso, o empreendedor precisa ser proativo: não basta apenas enviar os documentos no fim do mês; é preciso questionar, pedir relatórios e envolver o contador nas decisões financeiras da empresa.
Checklist Prático: Como Escolher o Contador Certo para Abrir sua Empresa
Antes de contratar, é fundamental fazer as perguntas certas. Use este checklist para avaliar se o profissional ou escritório de contabilidade está alinhado às suas necessidades e pode atuar como um verdadeiro parceiro.
- ✅ Especialização: Você tem experiência com empresas do meu setor de atuação?
- ✅ Planejamento: Qual natureza jurídica e regime tributário você recomendaria para o meu modelo de negócio e por quê?
- ✅ Custos: Quais são TODOS os custos envolvidos na abertura (taxas da junta comercial, certificado digital, seus honorários)? E qual será o valor da mensalidade contábil após a abertura?
- ✅ Serviços: O que está incluso na mensalidade? (Ex: Pró-labore, obrigações acessórias, suporte por telefone/e-mail).
- ✅ Tecnologia e Processos: Como funciona o envio e recebimento de documentos? Vocês usam alguma plataforma online que facilita a comunicação?
- ✅ Registro Profissional: Qual o seu número de registro no CRC? (Verifique a regularidade no site do conselho).
Perguntas Frequentes (FAQ)
Uma empresa do Simples Nacional (ME ou EPP) precisa de contador?
Sim, obrigatoriamente. Embora o Simples Nacional seja um regime tributário simplificado, ele não isenta a empresa da necessidade de ter uma escrituração contábil regular, assinada por um contador habilitado, para cumprir com as obrigações legais. A única exceção real é o MEI.
Posso abrir a empresa sozinho e contratar um contador depois?
Não para a maioria dos casos. O processo de abertura na Junta Comercial exige a assinatura e responsabilidade técnica de um contador. Tentar fazer o processo sem esse profissional resultará na impossibilidade de registrar o Contrato Social e obter o CNPJ.
Quanto custa o serviço de um contador para abrir uma empresa?
Os custos variam significativamente dependendo da cidade, do tipo de empresa (natureza jurídica) e da complexidade do negócio. Geralmente, há um custo único para o serviço de abertura (honorários do contador) e as taxas governamentais. Após a abertura, a empresa passa a pagar uma mensalidade contábil para a manutenção e cumprimento das obrigações mensais e anuais. É essencial solicitar um orçamento detalhado.
Sobre o Autor
Júnior Araújo
- Título: Contador e CEO da Junior Contador Digital;
- Registro CRC: SP-345376;
- Formação: Ciências Contábeis – Faculdade de Americana (FAM);
- Expertise Principal: Consultoria contábil e fiscal estratégica, com foco em estratégias de estruturação de holdings patrimoniais, planejamento tributário e otimização fiscal para empresas de diversos portes.
- Conhecimento Adicional: Integração de tecnologia em processos contábeis, Normas IFRS;
- Papel no Blog: Editor-Chefe e autor, compartilhando conhecimento prático para PMEs.
Referências
- Código Civil – Art. 1.179 – https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10656770/artigo-1179-da-lei-n-10406-de-10-de-janeiro-de-2002
- Lei Complementar nº 123 – https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp123.htm
- Sebrae – O Papel do Contador – https://sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/ms/sebraeaz/conheca-mais-sobre-o-papel-do-contador,e37028bd1363e710VgnVCM100000d701210aRCRD
- Sebrae – Taxa de Sobrevivência das Empresas – https://sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/artigos/a-taxa-de-sobrevivencia-das-empresas-no-brasil,d5147a3a415f5810VgnVCM1000001b00320aRCRD